Política Tocantins

ARAGUATINS: Justiça Eleitoral cassa mandato de Miguel do Cajueiro por fraude à cota de gênero no MDB

Sentença proferida pela 10ª Zona Eleitoral de Araguatins determinou a cassação de todos os mandatos vinculados ao MDB nas eleições municipais de 2024. A decisão, datada de 14 de outubro de 2025, representa um dos casos mais emblemáticos de punição por fraude à cota de gênero no estado do Tocantins e pode alterar significativamente a composição da Câmara Municipal.

O Caso que Levou à Investigação

A Ação de Investigação Judicial Eleitoral foi movida pela coligação “Araguatins Não Pode Parar” e pelo candidato Aquiles Pereira de Sousa contra seis investigados, incluindo o vereador eleito Miguel Pereira Silva e a candidata Luana do Nascimento Silva. O cerne da acusação era a suposta utilização de candidatura fictícia para burlar a legislação que exige no mínimo 30% de candidaturas femininas.

A investigação revelou uma sequência de eventos que chamaram a atenção da Justiça Eleitoral. Inicialmente, o MDB convocou convenção partidária em agosto de 2024 com oito candidatos, mas após exclusões e desistências, ficou com uma configuração que não atendia à cota mínima. Após ser intimado para corrigir a irregularidade, o partido permaneceu inerte, levando o Ministério Público Eleitoral a se manifestar pelo indeferimento do registro.

A Candidata com Zero Votos

O ponto central da investigação concentrou-se em Luana do Nascimento Silva, registrada em 14 de setembro de 2024 como substituta de outra candidata desistente. Os elementos que pesaram contra sua candidatura foram inequívocos: votação absolutamente zerada, ausência completa de movimentação financeira de campanha e nenhum ato público de promoção da candidatura.

Durante a instrução processual, testemunhas arroladas pela própria defesa do MDB acabaram confirmando a inatividade da candidata. Cláudio Carneiro Santana, ouvido como informante, foi categórico ao afirmar que “nunca viu ela trabalhando em campanha”. Pedro Gomes dos Santos, que atuou ativamente na campanha de outro candidato do partido, declarou que só conheceu Luana após a eleição. Antônio Edson Rodrigues Gomes disse ter ficado sabendo da candidatura apenas depois do pleito.

Defesa Alegou Perseguição Política

Os investigados apresentaram duas linhas principais de defesa. A primeira sustentava que houve perseguição política sistemática promovida pela gestão municipal, com ofertas de suborno e ameaças a candidatos e familiares para forçar desistências. A segunda argumentava que o curto prazo entre o registro e a eleição, somado a dificuldades financeiras, inviabilizou a realização de campanha efetiva.

Catiane Santana Oliveira, outra candidata do MDB que obteve 32 votos, relatou ter sofrido assédio político direto do prefeito, com ofertas de suborno e ameaças. Luana do Nascimento Silva afirmou que foi forçada a abandonar a cidade no dia do pleito por temer pela própria segurança física.

O Que Disse a Justiça

O juiz eleitoral José Carlos Tajra Reis Júnior fundamentou sua decisão em critérios objetivos estabelecidos pela Súmula nº 73 do Tribunal Superior Eleitoral. Segundo o entendimento consolidado, a fraude à cota de gênero configura-se pela presença de elementos como votação zerada ou inexpressiva, prestação de contas padronizada e ausência de atos efetivos de campanha.

Na sentença, o magistrado ponderou que, embora o clima de acirramento político fosse reconhecível, a prova testemunhal produzida pela defesa não alcançou a robustez necessária para afastar a fraude. Os depoimentos limitaram-se a narrativas de “ouvir dizer”, sem comprovação de fatos concretos que pudessem justificar a completa inatividade da candidatura.

Um trecho da decisão destacou: “A ausência de recursos financeiros não é empecilho para que os candidatos realizem atos de campanha, como a exemplo de comícios, passeatas ou o simples ato de pedir votos aos mais próximos”. O juiz ressaltou ainda que a defesa não apresentou qualquer testemunha que declarasse ter recebido pedido de voto da suposta candidata.

Consequências Jurídicas e Políticas

A sentença determinou a cassação do Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (DRAP) do MDB de Araguatins, documento que autoriza o partido a participar da eleição. Como consequência direta, todos os candidatos vinculados àquela chapa tiveram seus registros ou diplomas cassados.

Miguel Pereira Silva, que foi eleito vereador e atuava como presidente do partido, recebeu a punição mais severa. Além de perder o mandato, foi declarado inelegível por oito anos. A mesma sanção foi aplicada a Luana do Nascimento Silva. Os demais investigados – Adailton Brito, Catiane Santana Oliveira, Marcionil Santos Amaral e Valdenan Ribeiro de Sousa – perderam seus diplomas de suplentes.

A decisão determinou ainda a anulação de todos os votos obtidos pelo MDB e a recontagem dos quocientes eleitoral e partidário. Essa recalculação pode beneficiar candidatos de outros partidos que não alcançaram vagas inicialmente, alterando a composição da Câmara Municipal.

Precedente Nacional

A fundamentação da sentença apoia-se em entendimento consolidado do Tribunal Superior Eleitoral desde o caso emblemático de Jacobina, na Bahia, julgado em 2022. A partir daquele precedente, a Corte passou a considerar que a obtenção de votação zerada, prestação de contas sem movimentação e ausência de atos de campanha são suficientes para evidenciar o propósito de burlar a cota de gênero.

O TSE estabeleceu ainda que, comprovada a fraude, todos os candidatos vinculados ao DRAP devem ter seus mandatos cassados, independentemente de prova de participação individual no esquema. O argumento é que a glosa parcial tornaria o risco da fraude “rentável”, já que não haveria prejuízo real para quem se beneficiou do ilícito.

Recurso com Efeito Suspensivo

A sentença ainda não transitou em julgado, o que significa que os investigados podem recorrer ao Tribunal Regional Eleitoral do Tocantins. Segundo o Código Eleitoral, o recurso possui efeito suspensivo, mantendo temporariamente a situação atual até decisão definitiva.

Somente após o trânsito em julgado o cartório eleitoral deverá providenciar o recálculo dos votos, a atualização da situação eleitoral dos inelegíveis e, se for o caso, a diplomação de novos vereadores eleitos e suplentes.

Impacto no Cenário Político Local

A decisão repercute diretamente no equilíbrio de forças na Câmara Municipal de Araguatins. Com a cassação de um vereador eleito e quatro suplentes do MDB, a oposição ao prefeito Aquiles Pereira de Sousa – que foi reeleito – perde representatividade significativa no Legislativo municipal.

O caso também acende o debate sobre a efetividade das cotas de gênero na política brasileira. Criada para ampliar a participação feminina, a legislação enfrenta resistências que vão desde o mero cumprimento formal até esquemas fraudulentos como o identificado em Araguatins.

Especialistas em direito eleitoral apontam que decisões como essa, embora severas, são necessárias para desestimular práticas que esvaziam o propósito da lei. A punição coletiva dos candidatos vinculados ao DRAP fraudulento busca responsabilizar não apenas indivíduos, mas a estrutura partidária que viabiliza ou tolera tais irregularidades.

Fonte: Folha do Bico

Arimatéia Jr.

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